Sobre chicletes e umbigo
O mundo está ficando cada vez mais fitness. Termos como sem glúten, sem
lactose, low carb, ligth, diet, zero tomaram de conta das rodas de conversas, rede sociais,
programas de TV, prateleiras do mercado, revistas. Ouso dizer que as próximas
gerações talvez nem venham a conhecer muitas das guloseimas que existem
atualmente, ainda. Uma pena!
Tal suposição me motiva a registrar para
a eternidade uma pequena parte da história de Duda, nascida em Brasília/DF, nos
anos 90, época em que não havia tamanha preocupação e restrição dos pais sobre
a ingestão de doces – talvez fosse essa uma das muitas razões pelas quais a
vida daquelas crianças tenha sido mais leve e divertida do que as de hoje, que
gastam seu tempo livre enfurnadas em um tablet
enquanto comem bolachas de arroz e chá de hibiscos.
Era muito simples arrancar de Duda um
sorriso que ia de orelha a orelha: bastava lhe dar um chiclete. PingPong, Ploc,
BigBig, Bubbaloo, BolinBola, Huevitos, não importava o sabor. Embora seus pais insistissem em instruí-la a
mascar por um tempo e depois cuspir, ela sempre engolia. E a cada novo chiclete
desembalado vinha novamente a mesma a recomendação. As explicações dos pais eram
as mais variadas possíveis, começando pela mais esdrúxula: “Duda, se você
engolir, irá nascer um pé de chicletes em sua barriga”. E por acaso, lhe
poderia ocorrer coisa melhor do que ter sua própria produção de gomas de
mascar?!
Nem preciso dizer que essa
advertência não surtiu efeito algum. Os pais apelaram então para “Engolir
chiclete faz mal à saúde!”, e diante da insistência de Duda em não cuspir, o
aviso foi tornando-se mais trágicos como “Se você engolir, ele vai grudar nas suas
tripas e você vai morrer, menina!”
Por vezes, a pequena Duda deitava-se
mascando chiclete, acabava por dormir com ele na boca e faltamente o engolia, a
menos que a mãe percebesse o que se passava e silenciosamente o retirasse de
sua boca tão logo pegasse no sono. No dia seguinte, ao abrir os olhos, ela
procurava em vão pela guloseima que se lembrava de ter escondido em algum canto
da boca.
A menina, que ainda não compreendia os
porquês da vida, já havia criado mentalmente sua própria regra: só cuspir um
chiclete quando perdesse totalmente o sabor. Foi aí que, inusitadamente, criou
uma prática solução para o impasse entre o chiclete ainda com gosto e o sono. Quando
sentia suas pálpebras começarem a pesar, ali na cama mesmo, Duda rapidamente tirava
o chiclete da boca e guardava-o no umbigo para continuar mascando quando
acordasse.
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