Ao Papai Noel

 

Querido Papai Noel,

Minha mãe ama Natal. Ama ao ponto de ir ao mercado, passar o dia in-tei-ro preparando assados recheados, arroz, farofa e tudo mais que possa agradar os parentes, que esperam bem arrumados, reclamando da sua demora em chegar, de banho rapidamente tomado, cabelos molhados e unha por fazer, afinal nunca sobra tempo para se arrumar como gostaria após preparar tudo para a Noite Feliz.

Minha mãe ama Natal, Réveillon, Páscoa, dia das mães, dia dos pais, e qualquer outra data comemorativa que lhe permita reunir a família diante de uma mesa farta. Atrasada e com as mãos ocupadas com bandejas, ela chega ao som de murmurinhos e chistes por sua demora. Cabelos soltos molhados ou presos às pressas e esmalte descascado denunciam que, mais uma vez, não houve tempo para si, mas não importa. Independente da razão do encontro, ver a grande família reunida, com estômagos mais que cheios de seus quitutes, a faz feliz como uma criança abrindo presentes na manhã de Natal.

Minha mãe é a mais velha de seis filhos, e isso fala muito sobre ela. Arrimo da família, pau para toda obra, como diz minha avó. É uma mulher tão forte que nos faz duvidar de que também precise ser acolhida. Neste ano, não houve confraternização na Páscoa, nem no dia das mães, tampouco no aniversário do meu avô. Também não houve no dia dos pais, no aniversário da minha avó, nem no Natal, assim como não haverá na virada do ano.

Assim como minha mãe, sou a mais velha de duas irmãs. Diferente dela, não sou arrimo da família, nem pau para obra alguma, tampouco há a menor probabilidade de me verem encarar o combo “mercado-cozinha” no mesmo dia sem que tenham que lidar com meu mau humor até, pelo menos, a noite seguinte.

Não gosto de datas comemorativas comerciais. Não sou fã desses eventos. E não curto gastar preventivamente uma dose de lexotam enquanto prendo o cabelo às pressas, ou me render a algumas muitas taças de espumante para não surtar antes da sua chegada, bom velhinho. Hoje meu combo “Noite Feliz Ano Novo” é bem simples: banho tomado, cabelo solto, roupa confortável, sofá, luzes apagadas, sala iluminada apenas pelo pisca-pisca, silêncio, contemplação e uma caneca de chococcino Dolce Gusto, sem a cápsula de leite.

Não sei se já é muito tarde para te escrever neste ano ou se ainda é cedo demais para o próximo. De todo modo, ultrapassado esse impasse temporal, o meu pedido é que minha mãe tenha Natais, Réveillons, Páscoas, dias das mães, dias dos pais, e quaisquer outras datas clichês que lhe permitam reunir sua grande família diante de uma mesa farta, do jeitinho que a faz feliz como uma criança abrindo os presentes na manhã de Natal.

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